sexta-feira, março 03, 2006

Deus e o infinito (q. 1 a 3) - Conclusão

Olá a todos,

Vamos à conclusão do estudo?

1. O que de significativo pode haver no fato de Kardec ter iniciado O Livro dos Espíritos questionando sobre Deus?

É bastante significativo que a obra primeira da Doutrina Espírita, O Livro dos Espíritos, comece com a pergunta "O que é Deus?". Léon Denis, na obra Depois da Morte, explica que "Acima dos problemas da vida e do destino levanta-se a questão de Deus", ou seja, esta é a questão mais importante que em torno da qual devemos refletir. É a partir da idéia que formamos da Divindade que iremos pautar a nossa existência. Vejamos alguns exemplos:

- O materialista, que tenta, inutilmente, sufocar a idéia da Divindade em sua consciência, se permite buscar única e exclusivamente o aspecto material da existência, entregando-se às paixões até que a Lei da Vida, sutilmente, venha a apresentar-lhe a fatura, que será paga a custa de muitas dores e sofrimentos;

- O selvagem teme os fenômenos da natureza e, por isso, os têm como divindades, a quem adora com o único fim de aplacar-lhes a ira. Com o seu amadurecimento e intelectualização, ele vai compreender melhor esses fenômenos e vai dirigir sua adoração a uma idéia mais adiantada do que seja Deus;

- Os fiéis das religiões dogmáticas, assustados pelo medo imposto por seus condutores e pela interpretação ao pé da letra das escrituras, dão forma humana a Deus, impingindo-Lhe paixões e falhas que pertencem às criaturas e não ao Criador. É dessa forma que surge a intolerância, já que cada religião se vê com a posse única e exclusiva da "verdade". Essa intolerância foi, é e, infelizmente, ainda será a responsável por muitas guerras. Daí se pode aquilatar do avanço moral da criatura humana.

Mas a que veio o Espiritismo? O que significa a invasão organizada dos Espíritos? Por que o Professor Rivail se dispôs a organizar as mensagens enviadas pelos Espíritos? O Espiritismo representa um facho de luz na escuridão da existência. Os Espíritos superiores, por meio da organização de Kardec, vieram nos instruir sobre a realidade espiritual, sobre nosso destino. As luzes se iniciam com a definição inequívoca do que seja a Divindade:

- Inteligência suprema: todas as coisas, tanto do ponto de vista físico quanto moral, denotam uma ordem e harmonia, que só poderiam ser regidas por uma Inteligência superior. Léon Denis, na mesma obra citada, afirma que "o caos e o acaso não poderiam produzir a ordem a harmonia" e os homens tampouco poderiam criar leis permanentes e universais, já que eles são passageiros, limitados no tempo e no espaço;

- Causa primária de todas as coisas: Deus criou todas as coisas, mas Ele não foi criado. Se Deus tivesse sido criado, seu criador, sim, é que seria a Divindade.

Os próprios Espíritos alertaram Kardec de que nossa inteligência limitada só aos poucos, com a depuração de nosso Espírito, poderia compreender a Divindade.

Retornando à primeira questão de O Livro dos Espíritos, é de se notar que Kardec não perguntou "quem" é Deus e, sim, "que" é Deus, justamente para não dar margem para que continuássemos com a idéia do antropomorfismo divino, ou seja, a de um deus com forma humana, o velhinho de barbas brancas com o grande livro dos pecados humanos sob os braços...
Ainda um outro detalhe: existe uma corrente de "reformadores de Kardec" por aí, dizendo que as obras básicas têm que ser reformuladas. Para esses, o aspecto religioso da Doutrina não é importante, devendo ser realçado sempre a face científica do Espiritismo. A questão inicial de O Livro dos Espíritos sendo relativa a Deus é uma demonstração inequívoca da importância do aspecto religioso da Doutrina. Que veja quem tiver olhos de ver...

2. Onde reside a dificuldade de definirmos Deus?

Deixemos que Léon Denis responda: "Pode-se levar mais longe do que temos feito a definição de Deus? Definir é limitar. Em face deste grande problema, a fraqueza humana aparece. Deus impõe-se ao nosso espírito, porém escapa a toda análise. O Ser que enche o tempo e o espaço não será jamais medido por seres limitados pelo tempo e pelo espaço. Querer definir Deus seria circunscrevê-lo e quase negá-lo."

Está aí, portanto. O Ilimitado não pode ser definido pelo limitado. É por essa razão que a criatura tem insistido em dar ao Criador suas limitações, suas fraquezas, suas paixões. É por isso que a criatura insiste em "querer agradar" ao Criador por meio de promessas, de rituais, temendo-O como se Ele fosse um ser vingativo, irado...

Como escreveu Léon Denis, o Deus cioso do Velho Testamento perde cada vez mais terreno para o Pai Amoroso, infinitamente justo e misericordioso, que Jesus veio nos apresentar. Que fique claro que a figura de Pai é um símbolo para o tipo de relacionamento que devemos ter com a Divindade, ou seja, não é que a figura de pai sirva para validar uma visão antropomórfica do Criador.

3. Pode-se dizer que Deus é o infinito?

Os Espíritos não deixam dúvidas. Deus não é o infinito. Deus possui o infinito como um de seus atributos. Ele não terá um fim. O infinito mesmo é uma abstração, não é uma realidade em si. Aliás, como veremos adiante em nosso estudo, Deus possui os seus atributos ao grau infinito, de forma absoluta, isto é, não existe limitação para a Divindade.

De novo nos valendo de Léon Denis (sempre!), definir é limitar, portanto, é impossível definir o que é ilimitado. Será prudente que não forcemos uma compreensão da Divindade que fuja do nosso alcance atual. Com o tempo, com o nosso amadurecimento (intelectual e moral) as idéias em torno de Deus se tornarão mais claras.

Muita paz!

Bibliografia:

Léon Denis, Depois da Morte, Cap. 9, O Universo e Deus.

Arthur Conan Doyle, História do Espiritismo.